sábado, março 25, 2006

Além da Religião


Palestra realizada no evento VIDA ACADÊMICA - Bienal (14/03/2006)

Notas da apresentação de Ed René Kivitz (em formato livre)*


René Girad é um antropólogo cristão (católico) que através de seus livros nos ajuda a entender aspectos do Cristianismo que vão além da religião. Seus livros – para citar alguns são: Violência e o Sagrado, O Bode Expiatório, Longo Argumento do Principio ao Fim, Eu Via Santanás Cair do Céu como um Raio (Edição Portuguesa).

A maneira como Girard desenvolve sua análise, principia com o 10º mandamento ... “Não cobiçarás ...”. A construção é feita em cima da dominação mimética do ser humano de querer imitar seu próximo, ser igual a ele. É na quebra deste mandamento que geramos tensão e violência. E como o povo peca em conjunto, a violência é coletiva. Somos seres desejantes – sem saber por que, queremos, desejamos, ansiamos, cobiçamos ... Diferente de apetite que é um atributo natural e físico, o desejo vai além. Como um símbolo a ser alcançado, quero imitar o outro. SE eu admiro alguém, vou aspirar ser igual a ele.

A sociedade de consumo sabe trabalhar bem essa mecânica. As propagandas usam o ‘meu ídolo’ que possui, que veste, que tem algo – e esse algo eu vou desejar também. Eu quero igualmente usar, vestir, ter. Apesar de iguais – humanamente falando, nos tornamos rivais pois os objetos de desejo são escassos. A violência coletiva é gerada a partir daí. Por isso de: todos contra todos!

Deixamos de lado nosso objeto de desejo, para dar seqüência à violência. A própria violência é mimética. Não podemos nos satisfazer, então temos que partir para a violência, gerada que foi pelo ponto de tensão.

O senso de sobrevivência propôs um ponto de fuga. Ao invés de todos contra todos, escolhamos um bode expiatório. Sabemos que o problema está na sociedade, mas a forma de resolvermos essa tensão é através do sacrifício de um.

".. e que não pereça toda a nação."

No evangelho vemos em João 11:50 as palavras de Caifás (propondo a solução dentro desse arquétipo) “É melhor que um só morra, para preservarmos a nação” Poderia ser algo assim: “Vocês Os Romanos vão perder a paciência conosco e vão nos aniquilar como nação – é melhor a gente entregar esse homem, e que ele sirva de bode expiatório”.

Há um paralelo aqui com o Édipo que foi castigado e expulso. Um sacrifício para apaziguar os deuses. A paz voltou após isso.

A religião portanto constrói o altar para o bode, e toma o bode para justiça – realizando o sacrifício. O bode é assim divinizado. A sociedade estabelece o rito – o que não é a missa a não ser a repetição do sacrifício de Cristo? O rito é a substituição do fato a ser repetido.

Há nos evangelhos mitos idênticos, com uma diferença substancial – daí que faz do Cristianismo (o verdadeiro) não uma religião. E daí que o outro cristianismo (o não verdadeiro) é uma imitação de atos religiosos.

Nos outros mitos, o bode é culpado, logo sua morte é justificada e bem vinda. Esse bode participou dos problemas, dos erros e das culpas, junto com todo o povo. Então se usarmos o bode – que é igualmente culpado, não estaremos errando de todo, e ainda por cima vamos nos livrar da culpa.

Jesus é o Cordeiro

É exatamente aqui que não podemos nos perder! Por que Jesus não é bode – é Cordeiro! Ele não tem culpa! Diferente do bode ele é inocente! E se o bode fazia parte do povo culpado, já não podemos usar a figura com Jesus, pois ele é inocente como um Cordeiro.

O salmista interpreta e antecipa esse sentimento de Cristo à beira da morte: “Fiz coisas boas, sinais vários. Por que o povo me odeia?”

Em nenhum momento Jesus vem como bode, mas sim como Cordeiro, por ser sinônimo de limpeza, de pureza. E assim se repete ao longo do livro de Atos: “Vocês mataram um inocente” era a pregação recorrente. E mais (no evangelho completo) Deus ressuscita o inocente!

A morte, a última das desgraças, estava associada ao destino imposto pelos deuses. Morrer significava perdedor. Perdedor era o errado, o culpado. Veja o exemplo dos duelos medievais e até alguns séculos atrás: não era para ver quem era melhor (com a espada, como tiro), era para literalmente deixar nas mãos de Deus que a justiça seria feita à maneira dEle!! Deus não ficaria neutro, penderia para algum dos lados, e com certeza para o lado certo!

Davi e Golias foi um duelo. Como Davi poderia perder? O imperador romano já vaticinava: “Quem vai se levantar contra Roma? Os deuses estão do nosso lado!”

Vemos que com Cristo, as coisas mudam. Primeiro por Ele ser inocente. Depois por Deus te-Lo ressuscitado, e em terceiro lugar, porque Deus não estava do lado do algoz. Diferentemente do principio do bode expiatório, Deus se solidariza com a Vida.

Todo sacrifício em nome de Deus é errado

Girard cita I Coríntios 15 como um argumento de que Satanás não tinha idéia do que significava a morte de Cristo, nem da sua ressurreição. Ele foi pego de surpresa. Satanás não participaria do processo do bode expiatório se ele entendesse que não era um bode expiatório – e sim a morte e a ressurreição do Cordeiro inaugurando um novo tempo. Não vai ter mais sangue. A partir de agora Deus vai ficar do lado da vítima. Quem mata, mata Deus. Todo sacrifício em nome de Deus é errado! Porque o sacrifício vitima alguém, e Deus não está mais do lado do sacrifício porque essa era cessou – acabou!

Não dá para sustentar um processo de vitima e de sangue (sacrifício) em nome de Deus ou da religião, pois Deus não quer mais sangue. E Ele vai sempre ficar do lado da vítima.

Quando Jesus morreu, Ele quebra a lógica de vitimar. O Cristianismo (com e no) é o desaparecimento da religião. Esse é o grande fenômeno cristão por excelência!

Uma religião que exige sacrifício é diabólica

Entender a Graça é entender o verdadeiro Cristianismo. Uma religião que exige sacrifício é diabólica. Por isso muitos dos evangelicais precisam ler e estudar Girard. É uma leitura necessária. Uma igreja que vive da culpa e do medo, gera violência e nunca vai ser promotora da paz.

Veja o sermão do monte, e o significado da misericórdia, do pacificador, do amor, da compaixão, da solidariedade. Amar os amigos é fácil, ame os inimigos. Dê a outra face. Ande uma milha a mais, dê a capa e o sobretudo ...

Solidariedade não é para quem merece. É para quem precisa.

Há motivos que nos levam à angustia? Se não passarmos essa angustia por Deus, para Deus, seremos irresponsáveis. Vamos correr o risco de sermos violentos, motivados por raiva, por vingança. Deixamos a angustia dominar nosso coração.

A igreja verdadeira precisa mobilizar um exército de pacificadores e misericordiosos. Há angustia no nosso coração? Essa angustia é a semente de um sonho – é onde vem a esperança. A palavra pastoral: a oração vai regar essa semente. A gente leva para Deus a angustia, e Ele devolve esperança.

*(Anotações feitas e transcritas por Volney Faustini - sem revisão do preletor)

7 Comments:

Blogger Vilma said...

Fiquei com a última palavra: nós damos a Deus a angustia e Ele devolve-nos a esperança! Que paz!

qua. mar. 29, 10:51:00 AM  
Blogger Hernan said...

Muito interessante. Somos sempre questionados sobre a originalidade da mensagem cristã do sacrifício de Jesus. Os opositores alegam que várias culturas possuem a figura do sacrifício propiciatório. Agora fui esclarecido com este detalhe, pois no cristianismo a vítima imolada é o próprio Deus e isso põe fim o todos os sacrifícios da religião.

qua. abr. 12, 01:02:00 PM  
Anonymous Anônimo said...

Simplesmente demais!!!!
Fico com a frase acima:

nós damos a Deus a angustia e Ele devolve-nos a esperança! Que paz!

ter. jul. 18, 03:42:00 PM  
Anonymous Anônimo said...

Where did you find it? Interesting read China cosmetics Plastic surgeon thomas orcutt acyclovir side effects how many can i take peppermill hotel 26 casino Mortgage loans refinancing mi One liner blonde joke secret upskirt pictures Bets movie rentals Doctor david wikler las vegas henderson phone number tranny oral sex

seg. fev. 05, 09:52:00 AM  
Blogger Maya Felix said...

Palavras muito interessantes, vou postá-las no meu Blog, com sua permissão, Volney Faustini.

Maya

seg. nov. 26, 01:33:00 PM  
Anonymous Anônimo said...

Bom amigo não entendi o que você quiz expressar ao dizer que os "evangelicais" tem que ler e estudar Girard. Creio que para compreender a natureza de Deus, de Jesus e seus ensinamentos basta apenas ler a bíblia e deixar o Espírito Santo nos dar a revelação da palavra. E se você está se referindo as atitudes pecmainosas que os evangélicos renunciam por AMOR a Deus, quem está errado nesta história é você, porque a própria bíblia diz: "Porque aquele que quiser salvar a sua vida, perdê-la-á, e quem perder a sua vida por amor de mim, achá-la-á." Mateus 16.25, ou seja, aquele que não aceitar o pecado, renunciar ao "prazeres" carnais por amor de Jesus,achará a vida, a vida eterna! E mais: "Então disse Jesus aos seus discípulos: Se alguém quiser vir após mim, renuncie-se a si mesmo, tome sobre si a sua cruz, e siga-me" Mateus 16.24, Marcos 8.34 e Lucas 9.23. Como você vem dizer que sacríficios em nome de Deus é algo diabólico? Se nisso você se referiu a sacrificío de sangue eu concordo plenamente! Porém a vida de um cristão é uma vida de sacrifícios! Como foi citado no versículo anterior o discípulo de Jesus,tem de negar a si mesmo, as suas vontades, sua natureza pecaminosa para segui-lo.
O que eu vejo são apenas críticas infundadas, pessoas que querem relativizar a palavra de Deus, achando que Ele se adequa aos tempos! Mas a própria bíblia diz que DEus não muda, Ele é o mesmo ontem, hoje e sempre será.As pessoas dizem que servem a Deus mas fazem tudo ao contrário do que diz na sua palavra. Peferem ficar analisando e seguindo opiniões de autores em vez de praticar o que a palavra de Deus diz.

qui. mai. 21, 09:22:00 PM  
Blogger Volney Faustini said...

Já que vc veio até aqui, e ainda me chama de amigo, porque não se identifica?

Cuidado com sua defesa radical dos evangelicais e evangélicos. É nossa responsabilidade cuidar dos irmãos - por isso alertamos!

Há uma boa parcela de líderes que leva o povo evangélico a cair nessa religiosidade mórbida de sacrifícios - sem a operação do Espirito Santo, sem o foco na graça, e sem uma visão clara e abrangente da Palavra de Deus, da mensagem de Cristo e do Evangelho.

A chave trazida por Girard é de extrema importância pois foca justamente esse sacrifício religioso - que é nocivo e distante de Deus. Deus não quer isso!

Quando crentes atuam achando que o esforço de uma obediência a preceitos bíblicos encontrarão a salvação, caem no erro de Caim, da Torre de Babel e de todo e qualquer esforço humano, atentando contra o próprio Deus!

Deus não nos pede esforço no sentido desse tipo de sacrifício. Sabe por que? Porque Ele já fez tudo por nós - por mim e por você (leia Romanos 8 e a partir poderemos continuar a conversa).

Voce é sempre bem vindo, mas por favor se identifique - mesmo que para tanto vc tenha que fazer um sacrificiozinho.

qui. mai. 21, 10:02:00 PM  

Postar um comentário

<< Home